segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Paranoid

Por Rodrigo Batista de Oliveira – 5º Ano

A idéia deste texto surgiu na ocasião da II Mostra CAC onde coincidentemente aconteciam as primeiras exibições do filme de Gus Van Sant, “Paranoid Park”, no Brasil. Pensando que esta edição do jornal seria para refletir sobre o caráter, relevância e reverberações desse tipo de mostra dentro do Departamento, parece que este momento é propício para a escrita deste texto. Antes, o artigo se chamaria “Paranoid Cac”, mas achei que pareceria adolescente demais, embora eu goste do tom enfadonho, patético e adolescente que o título antigo possui.
Antes de falar sobre o filme, gostaria de ressaltar a relevância do cinema de Gus Van Sant para o panorama cinematográfico atual. Sem nenhum experimento mirabolante de linguagem, com a simplicidade de seus planos longos e fixos, seus recortes temporais e sua temática adolescente, ele consegue fixar uma pesquisa clara e que se desenvolve a cada filme de forma cada vez mais surpreendente. Os filmes dele basicamente falam sobra a apatia em relação à morte. Uma apatia que não surge de um descaso simples, mas de uma rede complexa de ações, inações, vontades e desejos velados. De forma muito inteligente, Gus Van Sant consegue falar dessas ameaças à vida sem culpar alguém, ou a sociedade, fazendo com que atos como o Columbine não sejam contados de forma maniqueístas. Não existem culpados, só existem apáticos.
No filme em questão acompanhamos a vida de um adolescente norte-americano, que faz parte do gueto dos skatistas, tem uma namorada, pais separados, mas que num acidente mata um policial. Culpado ou não, ele viu um corpo ser dividido em dois na sua frente. A partir daí ações paralelas acontecem, mas o pensamento do protagonista não poderia estar concentrado em outra coisa.
Talvez a grande metáfora do filme esteja nas longas e lentas tomadas dos jovens com seus skates girando em enormes tubos que parecem não ter fim. E é assim que senti o Departamento no fim da II Mostra CAC, vários bandos girando em túneis sem fim, cada um com o seu tipo de apatia, que se revelava em cada tipo de discurso, do mais engajado ao mais despreocupado.
A cena em que o protagonista e uma amiga discutem, através de um discurso vazio, a guerra no Iraque, sendo que ele tinha acabado de matar alguém, apresenta a metáfora de um falso engajamento. Um engajamento que está no discurso, preocupado com coisas que não diz respeito de fato com as questões que nos cercam.
O que nos falta é matar alguém (não preciso dizer que isso é uma metáfora), pois discutir a guerra no Iraque (também outra metáfora) fazemos muito bem e nos achamos engajados, informados, antenados e coisa e tal...
E o pior é que não estamos sozinhos como muitos pensam e escrevem, estamos em bandos, todos iguais com seus skates girando dentro de tubos gigantes e sentindo prazer. São bandos que escrevem as críticas, são bandos que pesquisam a linguagem, são bandos que torcem o nariz, são bandos que picham, são bandos que protestam, são bandos que ensaiam suas peças, são bandos que produzem seus textos, enfim, ninguém está sozinho. Esta idéia toda de individualização e ensimesmamento me parece já estafada. No mínimo temos que complexificar a individualização.
Mas, insisto, o que nos falta é matar alguém, para assim, vivermos com uma culpa, uma inquietação real, material, verdadeira.
Isso tudo está longe de ser uma teoria, manifesto ou qualquer coisa parecida, são só metáforas desconexas que criei ao ver um filme que só retrata a adolescência norte-americana como muitos críticos escreveram na época. O recorte de Gus Van Sant com certeza não diz respeito somente à fatia que ele escolhe.

2 comentários:

Fabrício Muriana disse...

É uma premissa parecida com a d'O Estrangeiro, do Camus. E mesmo depois que se mata alguém, mesmo assim não acontece nada.
Enfim, lembrei disso quando li seu texto.
Abraço

Liz disse...

Rô, fiquei pensando nas relações do teu texto com a carta a cibele, do paulo.

hum... será que já não matamos alguém e ainda não nos demos conta disso?
nesse sentido, talvez a comparação que o fabrício faz seja relevante.
matamos e tudo continua igual..

ai, penso que olhar pra a tal guerra do iraque, buscando entender suas complexidades e quem sabe descobrir o ponto em que somos nós também os assassinos seja importante neste movimento de sair fora desses túneis, desse falso engajamento.

só mais algumas metáforas desconexas e agoniantes...